A Lei Rouanet e o impacto sobre a economia da cultura local

0
198

Diante do cenário em que se encontra a economia da cultura, é preciso de alguma forma elucidar como se dá o processo de uso da lei e suas atribuições enquanto mecanismo de acesso a recursos destinados a cultura.

A Lei Rouanet é uma lei de incentivo instituída em 1991 que tem como principal objetivo o fomento à cultura. A mesma se divide em três mecanismos, sendo o MECENATO (incentivo fiscal) forma mais utilizada, o FNC – Fundo nacional de cultura (verba de acesso direto por emenda parlamentar) e o FICART – Fundo de Investimento Cultural e Artístico (nunca implementado). Dessa forma, o Mecenato mais difundido acaba sendo confundido com a própria lei.

Sobre o Mecenato, o Ministério da Cultura (hoje secretaria com poder de Ministério) dá a melhor definição: “O incentivo é um mecanismo em que a União faculta às pessoas físicas ou jurídicas a opção pela aplicação de parcelas do Imposto sobre a Renda, a título de doações ou patrocínios, no apoio direto a projetos culturais aprovados pelo Ministério da Cultura. Ou seja: o Governo Federal oferece uma ferramenta para que a sociedade possa decidir aplicar parte do dinheiro de seus impostos em ações culturais. Desta maneira, o incentivo fiscal estimula a participação da iniciativa privada, do mercado empresarial e dos cidadãos no aporte de recursos para o campo da cultura, diversificando possibilidades de financiamento, ampliando o volume de recursos destinados ao setor, atribuindo a ele mais potência e mais estratégia econômica.”

De fato, em tese o conceito é esse, mas na prática existem diversas problemáticas que geram confusão e discussão perante a população em geral. Vou citar e comentar apenas 3 delas:

A primeira e mais difundida, é a questão de afirmações que o “Ministério da cultura dá dinheiro para os artistas”, não é o que acontece, existe todo um fluxo regido por uma portaria ministerial que garante aos artistas (qualquer pessoa) apresentar propostas ao ministério para sem aprovadas por técnicos especializados na lei e passam por um crivo rigoroso de orçamento e cumprimento do objeto do projeto. Além disso, quem decide pela escolha de que o projeto será agraciado pela renúncia do imposto são as pessoas física e jurídicas que realizam aportes, e não o ministério que somente fiscaliza e chancela propostas.

A segunda, trata do “privilégio para grandes produções e artistas famosos”. De fato, sim, a decisão da doação/patrocínio é do patrocinador e não do Ministério, que afirma que compensa essa situação com a abertura de editais de acesso direto sem a figura do patrocinador. No entanto, ao meu ver, os editais não cumprem essa compensação, o poder do patrocinador com a lei de incentivo, onde o volume de recursos é muito maior, faz com que a escolha seja por projetos que terão grande visibilidade e em regiões de maior centralização, trazendo um enfraquecimento para os pequenos produtores e artistas locais frente as grandes produções culturais.

E a terceira, trata sobre “a dúvidas e medo dos patrocinadores de que irão cair na malha fina do imposto de renda”. Se o processo for feito de maneira incorreta, ou em desacordo com a lei isso realmente pode acontecer, no entanto o fluxo de aprovação e fiscalização do ministério foi montado para garantir, ou pelo menos minimizar, para que isso não aconteça, com certeza antes de chegar nesse ponto o projeto será indeferido.

Diante desse cenário, o qual posso aprofundar em mais detalhes em outro momento, pensamos no produtor local, o artista iniciante que luta pelo acesso a programas de fomento. E vemos claramente uma discrepância de acesso, uma vez que as grandes produções acabam por consumir ou senão abocanhar quase a totalidade de recursos disponíveis pelos patrocinadores próximos. Esse fato, só não é excludente porque existem medidas de democratização e exigências de valorização e contratação de fornecedores locais.

Cabe ao produtor/artista realizar suas atividades sendo subcontratados por produtoras que executam estes grandiosos projetos. É fato que, como em toda cadeia produtiva, quanto mais atravessadores, maior o custo e menos sobra para o produtor final, o que está na base de tudo.

E aí vem a pergunta, como reverter isso? Como se apoderar dos mecanismos de incentivo? Já passou da hora dos órgãos governamentais, que possuem maior “poder de barganha” frente a patrocinadores, ao invés de abocanharem os recursos priorizando artistas famosos e privilegiados políticos, cumprir seu papel enquanto representante da população e direcionar seus esforços para a captação/produção e execução de eventos incluindo e valorizando o artista local contratando seus produtos ao valor devido de mercado e pagando em dia. Dessa forma, a roda da economia cultural irá girar tanto para a cidade quanto para a evolução das pequenas produções locais que querem se tornar grandiosas.

E qual o papel do pequeno produtor? Está na hora de se profissionalizar, de se organizar como sociedade civil e prover meios de transferência de conhecimento através de ajuda mútua. Fiscalizar os órgãos públicos não permitindo que atravessadores da cultura recebam por uma coisa e paguem por outra. Não permitindo que agentes culturais que somente almejam lucro sejam única e exclusivamente detentores do conhecimento dos usos desses mecanismos.

Para fiscalizar e saber todos os detalhes dos projetos apresentados em andamento acessem o portal da transparência VERSALIC no link http://versalic.cultura.gov.br/, nele é possível visualizar todos os detalhes, desde os incentivadores do projeto como planilha de custos e prestação de contas.


Texto de Robson Mello

Coordenador de projetos | Thealth Sistemas | MBA Gestão de TI | MBA Gestão e desenv. empresarial | MBA Gestão Projetos